Quando a voz própria nao basta: invocaçao do outro e construcçao da autoridade no Cancioneiro Geral.

ALMEIDA RIBEIRO, Cristina, “Quando a voz própria nao basta: invocaçao do outro e construcçao da autoridade no Cancioneiro Geral”, en Voces e letras. Polifonía e subjectividade na literatura portuguesa antiga, ed. T. Brandenberger y M. A. Ramos, Berlín, Lit Verlag, 2019, pp. 93-112.

Resumen:

A poesia compilada por Garcia de Resende no Cancioneiro Geral abunda em citações de versos castelhanos, inseridos com igual à-vontade em composições escritas em português e na língua do reino vizinho, cujos autores encontram, não raro, no discurso alheio a eficácia expressiva que fortalece o seu próprio argumento. Também dignas de nota são, no mesmo corpus, as frequentes referências a poetas do cancioneiro quatrocentista castelhano, a quem é reconhecida autoridade, tanto no plano poético como no amatório. Comparáveis, pois, do ponto de vista da funcionalidade, citas e menções surgem, porém, normalmente dissociadas, como se os versos alvo de apropriação circulassem sob anonimato e os nomes valessem por si mesmos, devido à reputação entretanto granjeada. Num e noutro caso, a alegada insuficiência da voz própria justifica a convocação dessa voz outra, que, materializada em palavras que um dia proferiu ou ecoando simbolicamente na aura do nome daquele a quem pertence, é afeiçoada às necessidades do momento. Ambos os recursos supõem um exercício de manipulação e por isso, ao serviço de vozes que aspiram elas próprias à autoritas, uma mesma autoridade pode ser invocada em situações diversas e às vezes até diametralmente opostas. Sem prejuízo de um sobrevoo perspectivador desta questão, não deixará de reconhecer-se em Macías um caso exemplar, dado que, além de ser referido em diversos lugares e ter versos seus citados em várias composições do Cancioneiro Geral, vê a sua voz ficcionada na segunda parte do Cuidar e Suspirar, num contributo decisivo para a sentença final ditada por Amor.